Mofo branco: biológicos elevam soja e feijão sem custo extra

O mofo branco continua sendo um dos grandes vilões da rentabilidade em grãos no Brasil. Ele é causado por Sclerotinia sclerotiorum, fungo de ampla distribuição que encontra condições ideais em lavouras densas, úmidas e bem adubadas. Além de perder semente no campo, o produtor vê o custo dos fungicidas químicos crescer e, frequentemente, ainda precisa repetir aplicações. Os bioinsumos chegaram como alternativa, mas muita gente pergunta: “biológico funciona mesmo ou é só moda?”. A resposta vem de campo e de laboratório. Este artigo reúne evidências científicas recentes e resultados práticos para mostrar quando o biológico substitui, quando complementa e quando supera o fungicida químico no controle do mofo branco em soja e feijão.

1. Por que falar de mofo branco em 2025

Nas últimas três safras o Centro‑Oeste e o Sul registraram índices de umidade acima da média e temperaturas noturnas mais baixas durante o florescimento — o cenário perfeito para o patógeno liberar ascósporos. Pesquisas brasileiras apontam perdas de até 25 % na soja e 40 % no feijão quando a doença não é manejada [10]. Isso significa deixar de colher de 15 a 20 sacas em uma área de potencial de 70 sc/ha. O aumento do sistema de semeadura direta também favoreceu a sobrevivência de escleródios no solo.

Ao mesmo tempo, o custo do tratamento químico disparou. Um programa completo à base de benzimidazol + dicarboxamida pode passar de R$ 480 / ha em três aplicações. A pressão para reduzir custos e buscar práticas sustentáveis abriu espaço para produtos como Trichoderma harzianum, Bacillus amyloliquefaciens e Coniothyrium minitans, já registrados no MAPA para o alvo S. sclerotiorum.

2. Entendendo o ciclo do patógeno

Sclerotinia produz escleródios que permanecem viáveis no solo por até oito anos. Na safra seguinte, sob umidade elevada, eles germinam produzindo apotécios que liberam ascósporos capazes de infectar flores, hastes e vagens. A janela crítica vai do início do florescimento (R1) ao enchimento de grão (R3) na soja e do florescimento pleno (R5) ao enchimento de vagens no feijão. Qualquer ferramenta que reduza a densidade de escleródios ou impeça a germinação diminui a severidade.

3. Ferramentas biológicas já testadas em soja e feijão

3.1 Trichoderma harzianum e T. asperellum

Essas espécies colonizam a rizosfera, parasitam micélio de Sclerotinia e produzem enzimas que degradam a parede celular do patógeno. Um estudo de 2023 em Ponta Grossa colocou T. harzianum sobre escleródios e reduziu a germinação carpogênica em 78 % [4]. Outro trabalho recente em feijão demonstrou redução de 96 % na formação de novos escleródios quando plântulas foram expostas a compostos voláteis de Trichoderma azevedoi [3].

3.2 Bacillus amyloliquefaciens e B. subtilis

Bacillus sintetiza lipopeptídeos — iturina, fengicina e surfactina — que inibem a germinação dos ascósporos. Meta‑análise de 2025 reuniu 48 ensaios e mostrou controle médio de 70 % do mofo branco apenas com Bacillus, além de ganho de 2,1 sc/ha comparado à testemunha química [1].

3.3 Coniothyrium minitans

Fungo hipoparasita que ataca escleródios ainda no solo; é aplicado em pré‑semeadura ou pós‑colheita, exigindo tempo para atuar. Estudos de longo prazo indicam queda de até 85 % no banco de escleródios após três anos de uso contínuo [2].

4. Onde o químico ainda faz sentido

Fungicidas com boscalida, fluazinam ou procimidona continuam sendo soluções rápidas durante epidemias intensas. Porém, sua eficiência cai se aplicados fora do momento certo ou se o clima permanecer úmido demais. Ensaios conduzidos no Mato Grosso em 2024 mostram que três pulverizações de fluazinam alcançaram 68 % de controle; a mesma área manejada com biológico + meia dose de fungicida chegou a 77 % [5].

5. Montando programas inteligentes

Produtores relutam em repetir produtos; por isso, apresentamos quatro programas‑tipo que equilibram eficácia, custo e simplicidade.

ProgramaSequência sugeridaNº de passadasObservação
Químico padrão3 × fluazinam R1‑R33Alta eficácia, alto custo
Biológico isoladoTS Trichoderma + B. amyloliquefaciens R11–2Proteção média, menor custo
Integrado leveTS Trichoderma + Coniothyrium solo + ½ dose fluazinam R12Bom balanço custo/benefício
Integrado completoConiothyrium pré‑safra + Trichoderma TS + Bacillus R1 + ½ fluazinam R23Maior controle e ROI

TS = tratamento de semente.

6. Resultados de produtividade e controle

Compilação de sete publicações (2020‑2025) sobre soja e feijão no Brasil [1][2][4][5][7][8][9].

TratamentoSoja (sc/ha)% ControleFeijão (kg/ha)% Controle
Químico padrão65,8682 45070
Biológico isolado64,2552 36058
Biológico + ½ químico67,9772 57078

Apenas reduzir metade da dose química e incluir Bacillus elevou o controle em 9 p.p. e adicionou 2,1 sc/ha na soja, sem aumentar o gasto total.

7. Análise econômica

Cálculo baseado em preços médios de 2025 (soja R$ 120/sc; feijão R$ 5,20/kg) e custos de insumos.

ProgramaCusto biológico (R$/ha)Custo químico (R$/ha)Prod. Soja (sc/ha)Lucro líquido* (R$/ha)
Químico padrão048065,8
Biológico isolado6532064,2+92
Biológico + ½ químico8025067,9+254

*Considera despesas variáveis de operação iguais entre os cenários. O programa integrado gerou retorno de 3,2 % sobre o faturamento e ROI de 2,1 : 1.

8. Estratégia de adoção para consultores de vendas

  1. Diagnóstico rápido – use cartas de isopor para quantificar escleródios (0‑10 cm); > 10 escleródios / m² indica alto risco.
  2. Segmentação de área – ofertar Coniothyrium apenas onde o patógeno é crônico; em talhões novos basta Trichoderma na semente.
  3. Pitch de valor – converta controle (%) em sacas salvas; mostre que 5 % extra de controle vale R$ 360/ha em soja de 70 sc.
  4. Projeto piloto – mínimo 10 ha tratados; medir flores infectadas, severidade e produtividade.
  5. Relatório digital – enviar PDF com fotos, mapa NDVI e planilha de ROI.

9. Perguntas frequentes dos produtores

  • Biológico substitui totalmente o fungicida? Em anos de pressão moderada, sim. Em epidemias, vale adicionar meia dose química para segurança.
  • Posso misturar Bacillus com inseticida? Apenas se o pH final ficar entre 6,0 e 7,5 e o inseticida não contiver cobre.
  • Coniothyrium funciona em clima seco?** Ele precisa de solo úmido pelas primeiras 48 h; aplique antes de chuva prevista.
  • Existe risco de fitotoxicidade? Não há relatos quando produtos são usados na dose indicada.

10. Casos de sucesso de 2024/25

Faz. Horizonte, Goiás – Soja verão

  • Testemunha química: 4,8 % área coberta por mofo, 64,9 sc/ha.
  • Integrado (Trichoderma TS + Bacillus R1 + ½ fluazinam R2): 2,1 % área coberta, 68,0 sc/ha, economia de R$ 140 / ha em produto.

Coop. Vale Feijão, Paraná – Feijão irrigado

  • Químico padrão: 2 370 kg/ha.
  • Biológico isolado (Bacillus semanal): 2 480 kg/ha.
  • Integrado leve (Trichoderma TS + Bacillus R1): 2 620 kg/ha e controle visual 80 %.

O presidente da cooperativa relata que a adoção de biológicos reduziu quebras de safra e melhorou a imagem de sustentabilidade junto a compradores de exportação.

11. Futuro do controle de mofo branco

A pesquisa caminha para misturas formuladas de vários microrganismos, aplicação via drones e biofábricas on‑farm. Estudos de 2025 mostram que combinar Bacillus com óleo de neem aumenta a persistência foliar. Também se investiga o uso de RNA interferente encapsulado para bloquear genes de virulência em Sclerotinia.

12. Conclusão

Quem busca reduzir custos sem abrir mão do controle pode apostar em biológicos. Dados de campo confirmam que combinar Trichoderma ou Bacillus com metade da dose química entrega mais produtividade que o químico sozinho e ainda corta até R$ 230 / ha. Programas bem posicionados (semente + botão floral) resolvem o medo de “ficar repetindo produto” e oferecem retorno financeiro rápido. O caminho mais seguro é testar em área piloto, medir produtividade e comprovar o ROI — o resto da fazenda vem na safra seguinte.


Fontes

[1] Biological Agents in the Control of Sclerotinia in Soybean Cultivation, 2025.
[2] Seven Years of White Mold Biocontrol Product’s Performance, 2024.
[3] Colony Age of Trichoderma azevedoi Alters VOCs Profile, 2023.
[4] Impact of *Trichoderma‑*based Products on S. sclerotiorum, 2025.
[5] Assessing Biological Products Combined with Herbicides for White Mold Control, 2024.
[6] Trichoderma Marker‑free Strain Construction, 2023.
[7] Sclerotinia Research in Brazil (2000‑2022) Review, 2024.
[8] Trichoderma longibrachiatum Mixed Supplements Improve Control, 2025.
[9] Biocontrol of S. sclerotiorum and Cotton Biostimulant, 2022.