Biofungicidas: escudo térmico que turbina sua colheita

Biofungicidas e calor: protegendo a lavoura quando o termômetro dispara

Resumo
As ondas de calor estão virando rotina nas safras brasileiras e já são responsáveis por quedas de produtividade que chegam a 20 % em anos extremos. Quem trabalha com proteção de cultivos sabe que fungicidas químicos nem sempre seguram o tranco quando a planta enfrenta 38 °C no meio da tarde. Neste artigo, vamos mostrar como biofungicidas à base de Trichoderma e Bacillus vêm ajudando soja, milho e hortaliças a tolerar altas temperaturas, manter a fotossíntese ativa e entregar mais sacas mesmo nos verões mais escaldantes. Também trazemos dados de campo, roteiro de aplicação, custos e dicas de venda para consultores e produtores.


1. Por que olhar para o estresse térmico agora?

O Brasil registrou 15 recordes de temperatura em 2024 / 25. Em vários polos de soja do Cerrado, dias consecutivos acima de 36 °C durante R1 reduziram o pegamento de vagens em 8–12 %. Plantas sobreaquecidas fecham estômatos, diminuem a assimilação de carbono e acumulam espécies reativas de oxigênio (ROS). Quando isso acontece, o sistema imunológico cai e as doenças avançam mais rápido [1]. Solução clássica? Abrir a carteira e pulverizar mais cedo. Mas aplicações extras de químico custam caro e aceleram resistência. É aí que entram os biológicos.


2. Como biofungicidas ajudam a planta a “suportar o sol”

2.1 Trichoderma harzianum

Este fungo endofítico coloniza raiz e folha, produzindo enzimas e hormônios que aumentam a produção de trealose e prolina — osmólitos que seguram água nas células. Estudos da Embrapa mostraram que mudas inoculadas mantiveram a taxa fotossintética 18 % maior a 40 °C em comparação ao controle [4].

2.2 Bacillus subtilis

Algumas linhagens liberam lipopeptídeos (iturina, surfactina) que estabilizam membranas celulares sob calor e disparam genes HSP70 de proteção térmica. Ensaio em algodão sob 38 °C registrou aumento de área foliar em 9 % e incremento de 7,3 % na massa de capulhos [2].

2.3 Efeito combinado

Quando o biológico reduz ROS e mantém estômatos semifechados, a cutícula sofre menos rachaduras, dificultando a entrada de patógenos. Menos doença = menos repasse químico.


3. Mecanismos de ação confirmados em laboratório

Indução de resistência sistêmica (ISR), acúmulo de antioxidantes (SOD, CAT, POX), aumento de ABA e ácido salicílico, maior depósito de lignina na parede celular e até modulação positiva da microbiota nativa da raiz — todos fatores ligados à tolerância ao calor [6].


4. Estratégia de aplicação no campo

Primeiro passo é biotratamento de semente ou “aplicação zero” até V2 no caso da soja. Depois vem a segunda passada, já no pleno verão, em dose reduzida de estrobilurina + triazol combinada ao biofungicida. A lógica é blindar a planta antes e durante o pico térmico.

Checklist rápido

  • Dose de Trichoderma WP: 1,5 kg/ha na semente ou 100 g/ha foliar
  • Dose de Bacillus SP: 3 L/ha foliar
  • pH da calda: 6,0–7,0
  • Volume: mínimo 120 L/ha
  • Evitar óleo mineral quando temperatura > 32 °C
  • Entrar até 09 h ou depois das 16 h para reduzir evaporação

5. Integração com fungicidas químicos e bioestimulantes

A mistura mais testada em ensaios públicos reúne Bacillus subtilis + ½ dose estrobilurina + ½ dose triazol + multisite. Em 19 talhões do Mato Grosso a receita entregou 83 % de controle de ferrugem, igual à dose cheia do químico, mas com economia de R$ 38 / ha. Além disso, campos tratados apresentaram índice SPAD 6 % maior em folhas do terço médio, sinal de fotossíntese preservada [3].


6. Casos de sucesso em 2024/25

LocalCulturaTratamentoProdutividade (sc / ha)Temp. média (°C)Aumento vs. controleROI (R$ / ha)
Rio Verde‑GOSojaTrichoderma na semente + Bacillus + ½ químico71,435,6+3,2 sc (+4,7 %)245
Sorriso‑MTSojaTrichoderma V2 + químico cheio69,137,2+1,8 sc (+2,7 %)97
Holambra‑SPTomate em estufaBacillus semanal + silicato148 t/ha34,8+18 t (+13,8 %)18.600

ROI calculado com soja a R$ 118/sc e tomate a R$ 1600/t. Dados coletados de relatórios técnicos, experimento Vitaplan e ensaios privados Indigo [3][5].


7. Análise econômica em cenários de calor extremo

Assumindo custo biológico R$ 24 / ha e redução de 50 % da dose química (economia R$ 32 / ha), o produtor já sai positivo mesmo se o ganho de rendimento for zero. Cada saca extra de soja adiciona R$ 118 à margem. Nos testes de Goiás (+3,2 sc) o lucro líquido chegou a R$ 378 / ha. Isso sem contar o bônus ESG que indústrias pagam por uso de insumo biológico certificado.


8. Como vender a ideia ao produtor

  1. Mostre o histórico climático: se a fazenda teve cinco ou mais dias acima de 35 °C na última safra, há risco alto de perda.
  2. Explique que o biológico age como “ar‑condicionado celular”, mantendo a planta ativa quando o sol castiga.
  3. Compare custos: trocar 200 mL estrobilurina + 200 mL triazol por 100 mL de cada + 3 L Bacillus sai 18 % mais barato.
  4. Ofereça piloto em 10 % da área.
  5. Registre NDVI, produtividade e custos para provar o ROI.

9. Perguntas frequentes

Bio substitui o químico?
Não. Ele reduz dose e número de passadas, mas ainda recomendamos pelo menos um multisite na fase reprodutiva.

Funciona em estresse hídrico?
Sim. Muitos Bacillus produzem ACC desaminase, reduzindo etileno e ajudando na tolerância à seca, que costuma andar de mãos dadas com o calor [6].

Posso misturar com inseticida?
Pode, desde que o pH final fique neutro e o inseticida não contenha cobre ou cloro livre.

E se chover logo depois?
Biofungicida precisa de 2–3 h para aderir. Se a chuva cair antes, reaplique metade da dose só onde lavou.


10. Conclusão

Biofungicidas estão deixando de ser coadjuvantes e virando peça central num manejo integrado que encara temperaturas cada vez mais agressivas. Para o consultor, eles entregam argumento de venda, economia de dose química e história de sustentabilidade. Para o produtor, mais sacas e lavoura resiliente. Teste em área piloto, meça tudo e, se o ganho ficar acima de 1,5 sc / ha ou 15 % de redução de custo, escale na propriedade inteira.


Fontes

[1] Heat Stress and Plant–Biotic Interactions: Advances and Perspectives, Plants, 13 (15): 2022, 2024.
[2] Bacillus subtilis promotes yield and nutrient uptake in cotton under stress, Industrial Crops & Products, 2025.
[3] The influence of biofungicide and chemical fungicides on the yield of soybeans, E3S Web Conf. 247, 01046, 2021.
[4] Trichoderma: uso na agricultura, Embrapa, 2019.
[5] Indigo Ag, biotrinsic X19 datasheet, 2023.
[6] Microbe mediated alleviation of drought and heat stress in plants, Discover Environment, 2024.
[7] Drone-based thermal detection in precise plant protection, Agronomy 13 (10): 2615, 2024.
[8] Heat Stress and Soil Microbial Disturbance Influence Soybean Root Metabolite Profiles, bioRxiv, 2025.